terça-feira, março 18, 2008

Semana Santa Portuguesa na Indonésia.


" Se há ocasiões do ano em que os habitantes do cidade de Larantuca, capital do Concelho de Flores Timur, Indonésia, vivem as cerimónias imbuídas de tradições portuguesas é na Semana Santa. Larantuca foi das primeiras missões abertas pelos dominicanos portugueses em finais do século XVI. Em 1660, com a queda da possessão portuguesa de Macáçar, a comunidade local é enriquecida com a chegada de mais cristãos, uns chegados de Malaca e outros de Macáçar. Foi graças aos missionários dominicanos que se constituiu a Confraria de Nossa Senhora do Rosário que ainda hoje persiste, e que ao longo de quatro séculos continua a chamar-se “Konfreria Reinha Rosari”. Os membros desta Confraria são senhoras, de idade compreendida entre 60 a 70 anos e, que, todos os Sábados de manhã se reúnem na Capela de Nossa Senhora das Dores (Mater Dolorosa), para aí rezarem orações e cantarem cânticos em Português antigo.
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Em Larantuca, o Domingos de Ramos, que os locais chamam “Dominggu Ramu” marca o início da “Semana Santa” (os larantuqueiros conservam esta terminologia portuguesa). Na Quarta-feira, “Rabu Trewa” (quarta-feira de trevas), o ambiente social é de verdadeiro retiro: é proibido realizar festas, não pode haver comezainas e bebedeiras, nem discussões ou zaragatas; é proibido pescar, trabalhar nos campos, cortar árvores, apanhar lenha, buscar água, pilar o arroz ou milho, construir casas e fazer longas viagens. É um dia dedicado ao recolhimento e oração; e um dia dedicado á limpeza geral da cidade. Nas principais ruas onde vai passar a procissão, erguem-se oito “Armidas” (ermidas); são construídas, com ripas de bambu, quilómetros de sebe ao longo das duas margens da estrada. Nessa sebe são colocadas centenas de milhares de velas, feitas de favos de mel silvestre por senhoras, membros da Confraria.

Na Quarta e na Quinta-feira, os peregrinos chegados do recantos mais longínquos da Indonésia, cumprem as promessas “(em Larantuca, dizem mesmo “promessa”) nas duas capelas emblemá-ticas da cidade: a capela da Senhora Mãe, ou “Gereja Tuan Ma”, dedicada a Nossa Senhora “Mater Dolorosa” e Capela do Menino Jesus ou “Gereja Tuan Ana ou Kapela Santo Meninu”. Nesta última está guardado um caixão contendo a relíquia da imagem do Menino Jesus, que segundo a tradição foi encontrada no mar de Flores no século XVII, e desde então venerada pelos habitantes de Larantuka. Convém recordar que este pequeno caixão é tão sagrado que nunca pessoa alguma abriu, nem mesmo o Bispo da Diocese está autorizado a abri-lo. Em 1979, deu-se um terrível terramoto na cidade Larantuka. Centenas de casas foram destruídas literalmente por pedregulhos que vinham das encostas da montanha Mandiri. Morreram 163 pessoas... Mas as duas capelas ficaram de pé, intactas...

O clímax de toda a Semana Santa é o dia da Sexta-feira Santa. Depois das cerimónias que se realizam na Catedral “Reinha Rosari”, situada no bairro “Postoh”, bairro este fundado pelos portugueses em 1613, aquando da invasão do Holandeses à Fortaleza dominicana de Solor, dá-se o início à famosa procissão, que se tornou célebre em toda a Indonésia, desde a década dos ano 60 do século XX.

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Ao longo dos séculos XVII, XVIII, e na primeira metade do século XIX, não havia um único missionário residente na Ilha de Flores. Pois a Confraria da Nossa Senhora do Rosário foi a única organização que procurou preservar a religião católica naquelas ilhas. E quando em 1860, o padre holandês Jan Piter N. Sanders, enviado pelo Vigário Apostólico de Batávia (Jacarta), para visitar núcleos de cristãos perdidos nas ilhas do Oriente de Jawa (daí a palavra Timur) encontrou, para surpresa sua, senhoras que rezavam e cantavam em Português... e tinham por Padroeira, a Senhora do Rosário. Oxalá, a herança deixada pelos frades Dominicanos portugueses continue a perdurar e que a grande procissão da Sexta-feira Santa ajude os Peregrinos de Larantuca a viverem em profundidade a Páscoa de Jesus!".

D. Carlos Filipe Ximenes Belo

Bispo Tit. de Lorium e Administrador Apostólico emérito de Díli-Timor Leste




Mesmo num país onde os islamitas comandam a Fé que os Portugueses espalharam pelo Mundo e pela História continua viva.

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