.Não passou sem c
ríticas a ascensão meteórica da Schincariol no mercado brasileiro de cervejas. Em apenas doze anos, a participação da empresa nesse comércio deu um salto impressionante, de 4% para 12,5%. Ao longo desse período, a concorrência atribuiu tal avanço às brilhantes campanhas publicitárias financiadas pela empresa com o dinheiro que deveria ter sido usado para recolher impostos. Essa denúncia provocou um verdadeiro bate-boca no setor no fim de 2003. Mas nada foi provado. Pelo menos até a semana passada. Na última quarta-feira, uma ação conjunta entre a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público, batizada de Operação Cevada, confirmou a suspeita. A ação arrastou nada menos que setenta pessoas para a cadeia. Entre elas estavam os cinco sócios da Schincariol, a segunda maior cervejaria do país. A companhia, com sede em Itu, no interior paulista, é acusada de sonegar 1 bilhão de reais em quatro anos. Mas as suspeitas incluem outros crimes: evasão de divisas, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e corrupção ativa. O esquema de fraudes teria como base o subfaturamento na venda de produtos. A diferença entre o valor real do negócio e o declarado nas notas fiscais era embolsada "por fora" e podia chegar a 30% do total da transação. As investigações indicam também que a Schincariol remetia os recursos sonegados ao exterior e então comprava títulos do Tesouro dos Estados Unidos. Depois, vendia os papéis no mercado internacional e repatriava o dinheiro, concluindo o esquema de lavagem. A polícia acredita ter identificado ainda operações fictícias de exportação – sobre as quais não incidem impostos –, intermediadas por empresas de Foz do Iguaçu, no Paraná. Haveria também indícios de importação com falsa declaração de conteúdo e classificação incorreta de mercadorias.A força-tarefa passou catorze meses filmando, fotografando, cruzando dados e quebrando o sigilo telefônico dos envolvidos nas supostas falcatruas. "Descobrimos um dos mais sofisticados sistemas utilizados para fraudar impostos. Eles aperfeiçoaram o esquema depois de várias autuações feitas pelos fiscais", diz Gerson Schaan, coordenador da área de inteligência da Receita. O procurador da República José Maurício Gonçalves, responsável pelo caso, acredita que o material apreendido seja suficiente para denunciar os acusados por sonegação fiscal, com pena que varia de dois a cinco anos de reclusão. Já a acusação de lavagem de dinheiro pode render penas de três a dez anos de cadeia. A Operação Cevada teve lances cinematográficos. Começou na alvorada da quarta-feira, quando 600 policiais e 180 fiscais da Receita Federal se espalharam por doze estados brasileiros. A missão era deter suspeitos e cumprir 140 mandados de busca e apreensão. Foi às 6 horas da manhã que integrantes da força-tarefa se posicionaram diante da casa da família Schincariol, em Itu. Receosos de que se tratasse de uma tentativa de assalto, Gilberto Schincariol e seus dois filhos não abriram a porta. Na rua, os policiais prepararam um explosivo para tentar derrubar o portão da casa. Mas não foi preciso utilizar esse artifício. Os três tiveram a prisão preventiva decretada por cinco dias e foram transferidos para São Paulo. Outros dois sócios também foram detidos em Itu.A Schincariol, fundada há 66 anos, nega as acusações feitas contra seus dirigentes. Em nota, afirma que os documentos fiscais sempre estiveram à disposição do Fisco. Lamenta também a forma como foi conduzida a ação, pautada por um comportamento que a companhia define como violento e sensacionalista. Informa ainda que a empresa recolheu 1,15 bilhão de reais em impostos no ano passado, o equivalente a 44% do faturamento de 2,56 bilhões de reais em 2004. No auge da pressão da Receita, a Schincariol lançou mão de um expediente tosco na tentativa de melhorar sua imagem: comprar espaço editorial a seu favor na imprensa comprável. A estratégia claramente fracassou, pois a imprensa não comprável continuou noticiando regularmente os indícios de sonegação.
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